Lampião era herói ou vilão? Quem lê sobre o cangaceiro, que morreu há 84 anos, no dia 28 de julho de 1938, fica com essa dúvida. Independentemente da resposta, Mário de Andrade, no seu livro O Baile das Quatro Artes, no ensaio Romanceiro de Lampião, fala sobre Virgulino Ferreira da Silva. No texto, escrito em 1932, pouco antes da morte do personagem, discorre sobre os tipos de poesia do cantador nordestino e analisa os textos escritos por eles. “Os romances do ciclo dos cangaceiros são numerosíssimos e só António Silvino produziu vasta literatura de cordel. Lampião o segue imediatamente atrás, nessa literatura, e mui provavelmente ultrapassará o rival. Gustavo Barroso, nas suas Almas de Lama e de Aço, apenas dá notícia dum romance sobre Lampião, intitulado História do Bandoleiro Lampião. Vou adiantar um bocado o romanceiro do bandido famoso.” E cita como exemplo o texto de João Martins de Ataíde chamado A Entrada de Lampião, cujo trecho inicial pode ser lido abaixo:
Estatura mediana
O corpo bem-comedido
O rosto bastante oval
E queixo muito comprido,
Eis os traços principais
Deste que entre os mortais
Torno-se tão conhecido.
Ele traz o seu cabelo Americano cortado
Traz a nuca descoberta
Usa o pescoço raspado,
Os dedos cheios de anéis
Boas alpercatas nos pés P’ra lhe ajudar no serrado.
Tinha calça de bom pano
Paletó de brim escuro
No pescoço um lenço verde
De xadrez e bem seguro
Por um anel de brilhante
Que se via faiscante
Por ter um metal mais puro.
Usava óculos também P’ra encobrir um defeito
Moléstia que Lampião
Sofre no olho direito,
Mesmo assim enxerga tudo
Pois no sertão tem estudo
Faz o que quer a seu jeito.